Com los Recuerdos al hombro

FIQUE RICO SEM SAIR DE CASA

15 de set. de 2010

O "El Vaca que mató mi Hijo"

Impressionante como eu falo ou escrevo sobre esta pessoa. Talvez seja por causa dessa pessoa que eu seja do jeito que eu sou hoje. Acalmem-se. Não estou falando de nenhum exemplo a ser seguido ou uma pessoa a ser venerada ou adorada ou qualquer coisa do gênero. Não. Mas acredito que o caráter de uma pessoa é construído por etapas, com experiências, tanto boas e ruins.
Quando fui morar no Mutirão III, o Vaca logo tratou de me levar para o lado dele, pois ele tinha planos e eu contra ele seria uma ameaça. Não demorou muito. Logo fui seduzido pelas coisas fáceis do mundo. O Vaca tinha de tudo e eu, ao contrário, nada tinha. Então o que se podia esperar de um guri de dez ou onze anos? No começo fui presa fácil. Mas aprendi grandes lições que carrego até os dias de hoje.
Como disse, o "El Vaca" tinha planos. Ele era um homem muito "olhudo", ambicioso, cheio de interesses materiais. Quando fomos morar naquela casa, ele já tinha meu pai na palma da mão. Já o dominava completamente. Era o dono dele, em outras palavras. Meu pai fazia tudo o que ele pedia, exatamente tudo. 
Tanto fazia tudo que, na minha opinião, cometeu um dos maiores erros de sua trágica vida: vendeu (deu) a casa onde morávamos para esse cidadão de "olho grande".
Não arriscaria falar em valores, pois não me lembro quanto foi a negociação. Mas sei que foram mais ou menos nestes termos: meu pai dava-lhe a casa, em troca receberia um terreno com um chalé (que nunca foi dele), que ficava ali no Cerro da Pólvora, abaixo da Hidráulica, o Vaca quitaria sua conta no boteco e o restante, acreditem se quiserem, foi pago em mercadoria, isso mesmo, em mercadoria do boteco do Vaca. Um absurdo!!!! Mas isso não é nada. O chalé que ele deu era um lixo, insalubre, desumano, para dizer pouco. A casa (se é que dava para chamar assim) era de chão batido (quando chovia era um "deus nos acuda"), possuía apenas dois cômodos; dormíamos todos praticamente juntos, não tinha água encanada, apenas uma torneira na rua, não tinha luz elétrica e, pasmem, NÃO TINHA NEM BANHEIRO, isso mesmo, não tinha banheiro. Nosso banheiro era um canavial que ficava cerca de 30 metros campo afora. Um ambiente completamente insalubre e desumano. Uma verdadeira porcaria. O vagabundo ainda tinha coragem de abrir a boca e dizer que tinha nos ajudado. Mas nunca vi essa ajuda. Chegamos nesse momento ao fundo do poço, lugar inimaginável tempos antes, quando morávamos numa casa grande e arejada.
Tudo bem. Fazia parte de um plano, o qual me colocaria a frente de muita gente. Isso, a partir desse momento eu comecei a refletir como poderia mudar as coisas. Mas não conseguia traçar um plano. Não naquele momento. Pensa bem, era um infeliz, não tinha nada, era um magrelo fraco, mal-trapilho, que mal conseguia parar em pé.
Mas inconscientemente foi a partir daí que minha vida começou a mudar. Comecei ser parte dessa pessoa que sou hoje.
É claro não foi tão simples assim. Moramos nesse maldito lugar vários meses. Passamos um inverno terrível ali. Lembro-me até de uma história triste. Eu e meu irmão Paulo, estudávamos ali no Amaro Jr., pois era na época a escola mais próxima. Quando fomos embora para o Cerro, a escola ficou um pouco longe para o Paulo, que já dava sinais que pararia de caminhar em breve. Nós levávamos cerca de duas horas para chegar em casa; em circunstâncias normais, não levaríamos meia hora. Uma vez, uma das últimas que ele fora à escola, indo para casa, andávamos perto daquelas crateras que sempre existiram ali no Cerro. E estava escuro. O Paulo já não tinha força nas pernas, caía toda hora. Eu temia pela sua segurança, tinha medo sinceramente que ele caísse naquelas crateras. Por sorte não caiu. Mas ficou bem próximo. A partir dali ficou claro que ele não poderia mais ir a escola a pé. Pouco tempo depois ele deixou de caminhar de vez. Apenas andava de cadeira de rodas. Foi uma pena. Mas fazia parte da nossa vida.
Às vezes eu caio em devaneios e fujo um pouco do assunto, mas isso é proposital. Eu quero que os leitores entendam a minha situação naquela época, então eu puxo outros assuntos, para encrementar a história e não deixar nada passar.
Como citei anteriormente, moramos nessa "josta" apenas por alguns meses, graças ao bom Deus. Em seguida nos mudamos de novo para o Mutirão III. Inicialmente moramos nos fundos da casa do Vaca; depois nos mudamos para os fundos da casa que era nossa. Por incrível que possa parecer, fomos morar na parte dos fundos da nossa casa. Até parece brincadeira.
Essa casa (peça) também não era grande coisa. Era uma peça grande feita pelo Vaca (acho que ficou com pouco de medo, pois nunca nos pagou o preço) e era metade de alvenaria, metade de madeira. Tinha um banheiro que era meio social. Dividíamos com o locatário da parte de planchada da casa que era nossa.
Isso, o Maldito dividiu a casa em três: a parte principal, a da frente morava uma das "filhas" dele (há quem diga que ele nunca teve filhos de verdade), a do meio, que era de laje, ele alugava e finalmente a engenhoca de alvenaria-madeira, a qual a gente morava. Essa também era um lixo, mas não conseguia ser pior que a do Cerro. Mas ela só não caiu porque eu segurei com esteios, se não, tinha ido com os vários temporais que ela suportou.
Tão logo nos mudamos para ali, eu e minha mãe tratamos de traçar um plano para recuperá-la. Tentamos de todas as maneiras, mas não conseguimos. Envolvemos o maior número de pessoas possíveis, mesmo assim não conseguimos. Partimos então para a ignorância: arrombamento, destruição, roubos, etc. Mas não. O máximo que conseguimos foi recuperar a parte de planchada. Nada mais.
Moramos ali até 2003, quando fomos embora de vez da Vila, buscar outros ares, comigo já há bastante tempo no comando. Mas não entregamos a casa para o Vaca, demo-la para o Alcindo, um vizinho. O Alcindo vive lá até hoje, construiu lá. Na parte da frente mora a nega Guinga, que lá por 97 alugou aquela parte do Vaca, pagou uns dois meses e, nunca mais; apossou-se da casa. Bem feito. Tanto que ele queria se aproveitar, passaram a perna nele. Ele morreu sem nada, na verdadeira miséria. Tanto que ele queria somar posses, perdeu tudo. Mas principalmente, ele perdeu a dignidade, o respeito e o carinho que as pessoas sentiam por ele.
Em outro post, que servirá para complemento deste, escreverei o que eu fazia para prejudicá-lo, como eu fiz para tentar ao menos amenizar os problemas lá em casa, nessa época. Até lá.
Quero que o leitor possa interagir um pouco comigo. fiquem livres para comentar, criticar, dar sugestões ou me mandar recados. Prometo que responderei a todos.